Dada a oportunidade de exercer controle sobre outros, nós humanos facilmente nos pervertemos em direção ao destempero e à tirania. Planeta Dos Macacos – A Guerra nos leva por uma jornada sobre poder tão emocional e introspectiva quanto épica. Entenda porque a crítica cinematográfica preferirá ser tirana com um dos filmes essenciais desse ano.
Antes de tudo e mais nada, a franquia Planeta Dos Macacos é composta de filmes voltados ao público de sessão da tarde. Vamos tirar isso do caminho e baixar consideravelmente a altura do sarrafo. Essas não são obras para serem contrapostas a cinematografias como Dunkirk, a textos de teatro inglês, nem a roteiros com reviravoltas mirabolantes.
Por outro lado, Planeta dos Macacos – A Guerra habita um território muito mais complexo do que qualquer um dos filmes de super-herói com os quais nos bombardearam nos últimos 18 meses, qualquer filme de pirata, qualquer lançamento pro mesmo público em um passado nem tão recente assim.
E aí começa a vasta cadeia de méritos que a crítica irá ignorar.
Debaixo de um ou outro pequeno plot hole, Matt Reeves (Cloverfield) escreveu e dirigiu um Western que nos leva em uma jornada messiânica recheada de alegorias inspiradas em mitos ocidentais e orientais, muito mais complexa do que aparenta à primeira vista.
Os caminhos que Ceasar percorre entre o ódio e a compaixão, entre o exílio o lar, entre a perda e a conquista, são velhos conhecidos do público. E é ótimo que não seja uma narrativa nova, porque essa identificação abre espaço para que uma perspectiva emocional bastante única e – sem jogo de palavras – ancestral, atravesse todos os aspectos do filme (da direção à fotografia, trilha e atuações) e nos atinja de forma clara e contundente.
Os personagens são sólidos, com arcos muito bem definidos e interessantes em suas transformações, do começo até a última cena.
O texto é conciso, não existem diálogos desnecessários e o antagonista é completamente justificado em sua racionalização, o que diz muito sobre a bússola moral do roteiro.
Uma parte dos diálogos se dá através de linguagem de sinais ou gestos, e o silêncio atua propositadamente como ferramenta para produzir inquietação, com espaços vazios do espectro sonoro nem sempre sendo ocupados pela trilha.
Andy Serkis (Lord Of The Rings / Star Wars: The Force Awakens / The Prestige) dá vida ao protagonista Ceasar, e mostra claramente porque é um dos atores mais admirados da atualidade. Vou poupá-los de qualquer comentários sobre captura de movimentos e efeitos especiais. O homem merece um prêmio.
Woody Harrelson (Natural Born Killers / True Detective) entrega muito mais do que o esperado, como tem feito recentemente em títulos como Wilson.
Destaque para a jovem revelação Amiah Miller, com uma performance poderosa, ainda mais levando em conta a ausência de diálogos para a personagem.
Temos um coadjuvante cômico sem exageros que Steve Zahn (como Bad Ape) interpreta em sua melhor performance desde sempre.
Tecnicamente impecável, a direção faz boas escolhas entre planos fechados que valorizam as atuações e momentos épicos. Junte isso à fotografia do experiente Michael Seresin (Sleeping Dogs / Midnight Express) e a efeitos especiais bons o bastante pra te fazer esquecer totalmente que é um filme com computação gráfica.
A trilha de Michael Giacchino é maravilhosa como de costume, e carrega influências de Nino Rota: Um tema melódico que muda de significado quando sobreposto à diferentes harmonias, criando um senso de continuidade e coesão que corre paralelamente ao arco do protagonista. A influência do tema de “Amarcord” na melodia do tema principal é uma camada a mais de complexidade e referência, que adiciona uma perspectiva bastante valiosa sobre como Matt Reeves e Giacchino enxergam o filme.
Planeta Dos Macacos – A Guerra é um Cavalo de Tróia: Um filme aparentemente inócuo e feito para entreter o público jovem, (e que vai ser criticado como tal) mas com personagens inquietantes, um roteiro que lapida minuciosamente várias facetas desagradáveis da condição humana e nos propõe reflexões muito profundas através de conflitos emocionais genuínos e críticas sócio-políticas bem pontuadas. Tudo isso tecido em meio a explosões, suspense, perseguições, piadas de bom gosto e reviravoltas.
Além disso, o diretor escolhe servir-nos uma bandeja de prata coberta de referências, inferências e homenagens culturais elegantes, para quem estiver preparado para percebê-las.
Não deixe que o poder pervertido dos críticos lhe tiranize, e vá assistir!
Fechando a trilogia com um laço, Planeta Dos Macacos – A Guerra entra em cartaz dia 03 de Agosto em todo o Brasil, com opção 3D.