Marlène (Marion Cotillard) e sua filha Elli (Ayline Aksoy-Etaix), de 8 anos, moram em uma pequena cidade da Riviera Francesa, onde se esforçam para fugir do tédio e do serviço social.Por um homem que acabou de conhecer, Marlène decide deixar Elli por um tempo. Ao se ver sozinha, a pequena precisa se virar de muitas maneiras para lidar com os problemas que se seguem.
“Meu Anjo” (Gueule D’ange) é o filme de estreia de Vanessa Filho como diretora de longa e merece atenção… pelo menos segundo o Festival de Cannes. O drama foi selecionado para a categoria Un Certain Regard, que recebe filmes de diretores/as “iniciantes” e/ou “diferentes” do que habitualmente se é visto. É fato que o combo seleção em Cannes + atriz premiada no Oscar (Cotillard em Piaf – Um Hino de Amor) promete – e Marion Cotillard não deixa nada a desejar em sua performance – porém o longa traz pontos questionáveis no roteiro, escrito por Filho em parceria com Diastème.
As problemáticas atitudes de Marlène, mãe solo que se refugia em festas e bebidas junto à filha, alcançam o inacreditável e o impossível. Dos vários exemplos de negligência parental apontados no filme, alguns funcionam e outros não, beirando o caricato. Elli bebe álcool em 3 momentos diferentes, por exemplo, antes de ser flagrada. O flagra acontece, no caso, por ela estar em uma casa noturna, acompanhando a mãe e a amiga dela. Como a própria sinopse mostra, Marlène deixa a filha sozinha por um homem que acabou de conhecer. É compreensível vontade de apontar o alerta aos descuidos que uma criança pode sofrer, mas faltou um pouco de sutileza nas escolhas de roteiro.
Sozinha, a menina conhece e se refugia em Julio (Alban Lenoir), filho do vizinho o qual ela encontra em um parque de diversões, já nas andanças sem a mãe. Um dos pontos positivos na história, inclusive, ao desenvolver uma relação diferente entre a menina e aquele que ela acaba olhando como figura paterna, mesmo que rapidamente. Um respiro para as inúmeras desventuras da pequena. E é nessa relação que vemos o melhor de Ayline Aksoy-Etaix. Apesar de demorar mais do que o necessário para chegarmos à prometida saga de Elli, quando isso acontece, a atriz dá conta do recado. Durante a narrativa, acompanhamos a menina sentindo tristeza, raiva, saudade e desespero. É crível. E Vanessa Filho acertou aqui. Porém vemos a história em três perspectivas ao longo, que se confundem e não se vêem bem divididas durante o tempo dele, deixando a desejar um mais coesão narrativa.
A fotografia do filme chama a atenção pela escolha de planos fechado e a câmera na mão de Guillaume Shiffman. Não há tanta estabilidade como o convencional e a escolha ajuda na dramaticidade do filme. Há diversos planos contemplativos, silencioso e, às vezes, longos, permitindo ao espectador refletir mais sobre o que se passa nas cenas em questão, ou talvez, perder um pouco do foco, dependendo do seu nível de atenção. No fim das contas, “Meu Anjo” não é um filme simples. Os pequenos problemas de roteiro, assim como o ritmo levemente lento trazido pela montagem podem tornar a sessão tão lenta quanto, mas a dramaticidade do clímax (o qual não citei muito para evitar spoiler), as preocupações geradas pelas aventuras de Elli e as performances de Marion Cotillard e Ayline Aksoy-Etaix, podem fazer com que valha a pena assistir.