Este review foi realizado com uma cópia do jogo disponibilizada pela WB Games
De todas as controvérsias na indústria de jogos nos últimos anos, não acho que haja um jogo que tenha opiniões tão divididas quanto Hogwarts Legacy. Não há como negar que a saga Harry Potter marcou uma geração e tem uma legião de fãs; como alguém que acompanha a franquia desde os primeiros jogos do PS1, ver um título inédito onde você pode se criar dentro de Hogwarts e explorar livremente aquele mundo mágico é realmente empolgante.
Mas nem tudo são flores e temos aqui um grande problema chamado J.K. Rowling. Nos últimos anos, a criadora da franquia mostrou-se um ser humano detestável, dando um show de preconceito e discurso de ódio nas suas redes sociais. Rowling é transfóbica e financia diversos grupos extremistas que lutam contra o direito de pessoas trans. Infelizmente esse tipo de gente existe e essa mulher é um dos maiores exemplos da atualidade.
Essa situação trouxe um grande dilema ético para este jogo, que mesmo não tendo nenhuma participação de Rowling, acaba carregando sua marca. Alguns acreditam ser possível separar o autor da obra, enquanto outros apoiam um boicote e condenam o consumo. Não estou aqui para dizer se é certo ou errado jogar Hogwarts Legacy, pois isso é uma decisão pessoal, que vai da consciência de cada um. De todo modo, neste review daremos uma nota sincera e consistente com a qualidade do produto, independente de qualquer posicionamento.
Sua carta finalmente chegou
Hogwarts Legacy é a primeira obra da franquia que se liberta dos limites impostos pelos filmes e livros (sem deixar de respeitar o cânone). A história se passa no fim do século XIX e é totalmente independente, sem precisar se apoiar em eventos futuros ou personagens famosos. Por isso, falo com tranquilidade que este é o melhor spin-off da saga, além de ser o mais ousado.
Sendo um RPG de mundo aberto, aqui temos a oportunidade de criar nosso personagem e viver nossas próprias aventuras ambientadas nesse universo. Assumimos um bruxo que entrou em Hogwarts no quinto ano, algo que já é bem fora do comum; não parando por aí, seu avatar também é capaz de controlar magia ancestral, um poder que é praticamente uma lenda. A partir disso, deveremos descobrir mais sobre essa arte e ainda enfrentar um bocado de bruxos maléficos que querem tirar proveito das suas habilidades.
A personalização da aparência é legal, mas nada muito profundo. A partir de alguns rostos pré-definidos, é possível editar aspectos individuais, mas sem ir muito além. Também é possível criar personagens trans, selecionando voz e gênero livremente, sendo uma forma de protesto dos devs contra o preconceito de Rowling.
O prólogo um tanto cinematográfico do jogo mostra que a história pode ser mais profunda do que o esperado. O enredo é interessante e conta com personagens interessantes o suficiente para nos manter imersos até o final. Você também terá a oportunidade de conhecer alguns dos ancestrais de personagens famosos da franquia, então fique de olho nos sobrenomes!
O time de desenvolvedores teve liberdade para criar sua própria versão de Hogwarts e do mundo mágico, então mesmo com as diversas semelhanças ao material original, não deixa de ser autêntico! Toda a ambientação é muito próxima dos filmes, inclusive o visual das criaturas mágicas, que também foram retratadas da mesma forma. Ainda é possível encontrar diversas referências e easter eggs ao Wizarding World, o que é bem legal.
Mais mágico que o original
É impossível não exaltar o trabalho magnífico da direção de arte deste jogo. A primeira vez que você tem a oportunidade de explorar Hogwarts é um momento único e não tem como não se surpreender com cada cantinho. São muitos detalhes e praticamente qualquer porta pode ser aberta, então o castelo inteiro está à sua disposição. Algumas portas estarão trancadas de início, mas conforme se avança na história, é possível ir desbloqueando mais áreas aos poucos.
Hogwarts é um castelo vivo e acontece muitas coisas ao mesmo tempo: os quadros se mexem, os alunos podem desencadear eventos aleatórios (receber berradores, usar magias e coisas do tipo) e, eventualmente, você pode até encontrar fantasmas e figuras icônicas como Pirraça, um personagem exclusivo dos livros. Só achei que muitos ambientes são meio vazios e não contam com NPCs circulando, o que dá a impressão que o castelo está inabitado.
A riqueza de detalhes vai além de Hogwarts. Você pode explorar todos os seus arredores, incluindo o vilarejo de Hogsmeade e uma porção de lugares que os fãs ainda não conhecem. Me surpreendi com o tamanho do mapa e isso até justifica o fato de podermos nos locomover com uma vassoura ou uma montaria, pois é realmente complicado de sair explorando tudo a pé.
As missões secundárias são um incentivo para sair vendo pontos do mapa que a história não nos leva, o que é muito bom. Cada sidequest traz uma historinha e nos estimula a usar diferentes feitiços de formas novas, então são atividades bem divertidas de fazer entre uma missão principal e outra.
Combate sem limites
O combate provavelmente foi uma das partes mais difíceis de adaptar, pois transformar um confronto de varinhas em algo dinâmico e divertido não é tão simples quanto parece. A solução que a Avalanche encontrou foi aplicar as famosas mecânicas introduzidas por Batman Arkham, que divide as lutas em três movimentos principais: ataque, bloqueio e contra-ataque.
O jogo dá um sinal do momento exato de usar um feitiço de bloqueio e contra-atacar o seu oponente. Ao desbloquear novos feitiços, você conseguirá atacar de novas formas, mas a complexidade dos duelos também aumenta. Os inimigos geralmente são protegidos por escudos de cores diferentes, cada um exigindo um feitiço específico para quebrar. É preciso pensar rápido e memorizar todas essas combinações para se sair bem, o que nem sempre é tão fácil na hora da ação.
Hogwarts Legacy até te dá carta branca para usar magia proibida! Não existe sistema de moralidade, então você pode agir como um completo babaca com todos ao seu redor, assim como quebrar as leis por diversão. Na arena de combates, é possível até mesmo usar Avada Kedavra sem limites – mas infelizmente, esse conteúdo só está disponível para quem comprou a versão Deluxe do jogo, o que não tem cabimento.
Já citei muitas coisas até aqui, mas ainda tem mais! O jogo é bem extenso no quesito de “variedade de atividades paralelas” e também permite aos jogadores criar sua própria Sala Precisa (totalmente personalizável) e cuidar várias criaturas mágicas dentro de uma maleta, igualzinho ao Newt Scamander. A única coisa que falta foi o quadribol, que infelizmente não é jogável, mas devido à abundância de conteúdo, podemos relevar.
Não é exagero dizer que Hogwarts Legacy é um forte candidato à GOTY. Este não é apenas um RPG de mundo aberto de altíssima qualidade, mas também o título absoluto da série Harry Potter, de pirar a cabeça de qualquer fã de longa data. É uma pena que a reputação da franquia tenha sido manchada pelo péssimo caráter da criadora, mas uma coisa ninguém pode negar: este jogo está incrível.